Observatório das Metrópoles nas eleições: um outro futuro é possível
Publicado no jornal O Tempo em 18 de março de 2024 | 07h00
Por Henrique Porto, João Vitor Rodrigues* e Ana Isabel de Sá*** Publicado em 18 de março de 2024 | 07h00
No dia 31 de Janeiro, o prefeito Fuad Noman (PSD) anunciou a retomada das rodadas do Orçamento Participativo (OP) para os anos de 2024 e 2025. A política estava paralisada desde 2017, quando o então prefeito Alexandre Kalil (PSD) decidiu por suspender a realização de novas rodadas do OP enquanto o passivo de 450 obras não fosse concluído. Atualmente, restam 90 obras não iniciadas e 140 em execução; ainda assim, a prefeitura optou por lançar uma rodada para o acolhimento de novas demandas, após sete anos de paralisação.
O OP foi lançado em Belo Horizonte em 1993, na gestão de Patrus Ananias (PT), e significou um grande avanço na política urbana da cidade, levando obras de infraestrutura e equipamentos públicos para as regiões mais necessitadas. Com o passar dos anos e as trocas de gestão, a política deixou de ser prioritária para a administração municipal, perdendo recursos e efetividade na execução das obras eleitas pelos participantes.
Em 2022, contudo, a Câmara Municipal aprovou um projeto de emenda à Lei Orgânica que confere execução obrigatória às obras do OP e destina anualmente 0,2% da receita corrente líquida do município para a política.
O recente anúncio da realização de uma nova rodada do OP promete o investimento de pouco mais de R$ 73 milhões para o acolhimento de até 90 demandas (dez por regional). A rodada está prevista para ter início ainda no mês de março e será focada apenas nas vilas, favelas e conjuntos habitacionais (Zeis) e loteamentos, cooperativas e ocupações organizadas (Aeis 2) para obras de infraestrutura e saneamento.
Apesar do evidente avanço da retomada das rodadas e incorporação de novas demandas, restam algumas controvérsias. A primeira delas é o fato de que o anúncio da retomada ocorreu apenas no último ano de mandato do atual prefeito e, consequentemente, em ano eleitoral, de forma que a atual gestão não será responsável pela execução das obras escolhidas, mas, ainda assim, receberá os méritos da retomada da política (mesmo com obras do passivo ainda paralisadas).
Ademais, apesar da pertinência e inovação do enfoque em Zeis e Aeis 2, essa decisão restringe o alcance da política, de forma que a expectativa da PBH é de pouco mais de 12 mil participantes, muito menos do que os mais de 170 mil já registrados em OPs anteriores. De modo semelhante, os R$ 73 milhões destinados a esta edição, apesar de um valor significativo, demonstram um apequenamento do OPBH diante dos montantes investidos em rodadas passadas (que já chegaram a R$ 150 milhões).
Finalmente, destaca-se que a nova rodada, ao que tudo indica, será realizada com pouca ou nenhuma renovação metodológica, além de concentrada na pequena equipe da PBH dedicada a essa política.
Para qualificar a retomada do OP na cidade, é essencial que o debate sobre essa política seja atualizado. É necessário que o OPBH seja reformulado com base nas melhores práticas nacionais e internacionais de OPs que avançaram bastante nos últimos anos.
Nesse sentido, é preciso que sejam incorporadas ferramentas digitais para a realização de processos híbridos e disponibilização de informações; que se possibilite o acolhimento de demandas de outras naturezas (que não apenas obras e equipamentos); que o instrumento seja melhor vinculado aos mecanismos de planejamento urbano e, principalmente, que a estrutura da PBH e os valores investidos para a realização do OP sejam ampliados.
Em suma, a retomada do OP em Belo Horizonte deve ser feita com vistas a resgatar seu potencial democratizante, participativo e de fortalecimento das demandas populares.
()Henrique Porto é graduado e mestrando em arquitetura e urbanismo (UFMG). Pesquisador dos grupos Cartografia do Orçamento Participativo em BH e Geopolítica e Planejamento Territorial. ()João Vitor Leite Rodrigues é economista e doutorando em arquitetura e urbanismo (UFMG). Pesquisador do Laboratório de Estudos Urbanos e Metropolitanos e do Núcleo RMBH do Observatório das Metrópoles. ()Ana Isabel de Sá é graduada e doutora em arquitetura e urbanismo (UFMG). Professora do IFMG – Santa Luzia e pesquisadora dos grupos Cartografia do Orçamento Participativo em BH e Geopolítica e Planejamento Territorial